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sábado, 29 de março de 2014

--- Um Poema à Palavra.


TUCANO NA CUT
PREFÁCIO DO JORNALISTA SEBASTIÃO NERY

Inprincipio erat verbum. No começo era a palavra. Está na Bíblia e está na história do homem.

O homem é a palavra. A história é a palavra. A história do homem é a história da palavra. O mistério de sua linguagem. A magia de seu dizer.


Na Grécia livre de Péricles, a palavra era o discurso. Na Judéia oprimida de Cristo, a palavra era a parábola. Na Idade Média torturada de Galileu, a palavra era o silêncio. No coração túmido do homem moderno, a palavra é a poesia. O que é a Bíblia senão a fábula do povo judeu tiranizado sob os salgueiros da Babilônia? O que foi a tragédia grega senão a metáfora da liberdade? E as fábulas do escravo Esopo, cordeiro respondendo ao inquérito do lobo? E Bernard Shaw, roendo a empáfia do império britânico?


Por isso Ronsard, o poeta do amor e da morte, disse que “a palavra é a única magia: a alma é conduzida e regida pela palavra”: (“La parole, Ronsard, est la seule magie; L’ame par la parole est conduite et regie”).


Shakespeare buscava na palavra o tempo do tempo: -“Que tempo enorme uma palavra encerra!” (“How long a time lies in one little world”!).


Este livro é um poema à palavra, à magia e ao mistério da palavra. Rômulo Marinho, advogado, talentoso, culto, pesquisador, fez um estudo magistral sobre uma das mais belas, sonoras e cantantes palavras da linguagem universal, o palíndromo:


palindromo em grego, palíndromo em português e espanhol, palindrome em francês e inglês, palindròmo em italiano, palindrom em alemão. Depois de uma pesquisa na literatura e na bibliografia sobre palindromia, reagiu, com razão, às definições truncadas ou incompletas de dicionários e enciclopédias, e conseguiu uma definição completa, perfeita e, se me permitem a ênfase, definitiva.


“Palíndromo é palavra, frase ou número que, lidos da esquerda para a direita ou vice-versa, são literalmente iguais”. (como “Ana”, “Amor a Roma”, “63736”).


Não vou, antecipando, quebrar o encanto do que vocês vão ler.Primeiro, um criterioso e aprofundado estudo sobre os palíndromos, desde os gregos e os romanos. Depois, 202 palíndromos por ele criados, verdadeiros achados linguísticos:



- "A base do teto desaba".
- "A Diva em Argel alegra-me a vida"
- "Oto como doce seco de mocotó".
- "A droga do dote é todo da gorda".
- "Laço bacana para panaca boçal".
- "Seco de raiva, coloco no colo caviar e doces".
- "O teu drama é amar dueto".
- "O terrível é ele vir reto".
- "E até o papa poeta é".
- "Seco de raiva coloco no colo caviar e doces". 
- "Tucano na CUT"

E, finalmente, um fascinante jogo de palavras que Rômulo Marinho inventou, a “palindromagia”, uma charada invertida, uma nova e mágica palavra cruzada.

Em “O Nome da Rosa”, Umberto Eco nos contou a fantástica história dos loucos monges medievais que se enfrentam, dilaceram e matam para esconderem mistérios ocultos em mágicos livros, escritos com tintas venenosas e disfarçados no labirinto de uma inacessível biblioteca, trancada na torre do mosteiro plantado sobre montanhas geladas.


A palindromia também é um misterioso mosteiro, antigo de séculos, mas literário, etimológico, poético, sem veneno e sem mortes, embora cercado de superstições e esotéricos ocultismos. Sempre foi usada para, atrás de palavras e construções verbais exóticas, transmitir dissimuladas mensagens, algumas até hoje indecifradas.


E o livro se embeleza todo com as primorosas ilustrações de Kácio. Um livro para saborear na rede, diante do lago (ou do mar).


Brasília, 8 de março de 98.

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